PEDRO BOLÉO, Público, 28-4-2009

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Finalmente o concerto de encerramento, que não foi apenas festivo: teve sumo. Às 21h30 o Grande Auditório encheu-se completamente para ouvir a Orquestra Metropolitana de Lisboa. Excelente começo com Zilm a dirigir muito bem a notável orquestração de Anton Webern da Fuga Ricercata de Bach. Menos brilhante foi a curiosa Simple Symphony de Benjamin Britten – apesar de ser tão “simple”, houve alguns desacertos rítmicos. Seguiu-se o Concerto Brandeburguês n.º 3 de Bach, “completado” por António Pinho Vargas. A encomenda do CCB consistia em propor a Pinho Vargas a composição de um segundo andamento (com a duração aproximada dos outros dois) para completar o concerto de Bach, incompleto não se sabe ao certo porquê. O compositor português aceitou a proposta de forma paradoxal, recusando a “reconstituição” como ideia-chave, numa opção muito interessante e até corajosa na perplexidade que sabia que podia causar. Não só chamou à sua composição “an impossible task” (uma tarefa impossível), como escreveu uma música em certa medida “contra Bach” – contra a sua posição quase divina na história da música (que justificava comercial e historicamente todos estes Dias da Música) e contra o enorme peso e a ideia de “eternidade” e universalidade das obras do compositor alemão. A leveza (que era uma das propostas de Italo Calvino para o nosso tempo) foi conseguida, e a ligação com a música de Bach foi sobretudo feita através da citação de “gestos” da música barroca e a partir de uma minúscula célula musical do primeiro andamento do concerto. Mas a atitude era toda contemporânea, e a sua tarefa impossível foi uma oportunidade paradoxal, mas bem sucedida, de reflectir musicalmente sobre o que podemos fazer hoje a partir de Bach – não reconstituir, endeusar e atafulhar o museu, mas simplesmente compor outras coisas.
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PEDRO BOLÉO, Público, 28-4-2009