António Pinho Vargas

PT

/

EN

MENU

13 de julho, 2025

Sobre as Sete Canções de Albano Martins (2000)

Sobre as Sete Canções de Albano Martins, quero dizer duas coisas: primeiro que o poeta foi meu professor de Latim no ano lectivo 69/70, e pertence à categoria daqueles raros professores que, apenas por serem como são, mudam a vida das pessoas para sempre; segundo, conhecendo a sua poesia há muitos anos, escolhi poemas do livro de 1998, "Escrito a Vermelho"; agrupei-os em duas ou três categorias para meu uso privado: os limites do criador, o trabalho do poeta., a desgraça do mundo; Soube pouco depois de ter começado o trabalho que Ramos Rosa tinha escrito um livro intitulado "Vinte Poemas para Albano Martins" o que reforçou o laço afectivo entre os dois ciclos. No entanto sobre a música o meu laconismo atinge aqui o seu limite. 

//

Escrever música para um poema já escrito perante mim desencadeia uma resposta vastamente libertária. É nessas circunstâncias que as ideias musicais mais extravagantes podem ocorrer, nas sua ligação obscura com o sentido das palavras. Schoenberg e os seus amigos na fase atonal - ou da atonalidade livre - face à desconfortável ausência do sistema tonal como articulador de forma, usaram o texto frequentemente como elemento preexistente gerador de formas. Reclamar isso é um inútil recurso a um argumento de autoridade. Mas é um facto que trabalho numa posição historicamente simétrica à daqueles. Mesmo nos Três Versos de Caeiro foram os ditos versos de Alberto Caeiro - um ingénuo programa de compositor - ligados à vida interna das figuras musicais, que provocaram, por assim dizer, a existência da peça. Como estas metáforas são emimentemente subjectivas, pude usar música destas peças noutras situações literárias ou de representação, nas óperas "Édipo, tragédia do saber" e "Os Dias Levantados". Tal como Wagner usou o lied Im Treibhaus no início do 3º acto do Tristan. Outra vez o argumento da autoridade! Sempre inútil, embora talvez servindo para dessacralizar o grande trabalho dos compositores do passado, para salientar o seu carácter humano, como tal, sujeito às contingências que marcam a nossa relação com o mundo.

 

antónio pinho vargas

//

in CD Versos & Verses and Nocturnes, Naxos

1. Compromisso das Sete Canções de Albano Martins (2000) Paulo Ferreira, voz, Jaime Mota, piano