Alberto Mourão, Jazz.pt, #20

Está de regresso o pianista e compositor que na década de 1980 gravou alguns dos mais belos discos nacionais do género. O novo album de António Pinho Vargas, o duplo Solo, foi apresentado ao vivo em Julho passado no CCB. (…) \”Perdido\” para a músicoa erudita contemporânea faça o que fizer no futuro Pinho Vargas tem lugar de destaque na história do jazz em Portugal. Esteve envolvido no primeiro LP de jazz gravado por portugueses \”Malperthuis\”, de Rão Kyao, quando ainda assinava António Pinho da Silva e nos anos 1980 lançou alguns dos discos que maior sucesso tiveram nesta area musical (…) Acima de tudo a sua importancia reside no facto de ter dado identidade portuguesa ao jazz, algo que continua a não ser comum num país que prefere seguir passivamente o modelo americano. As excepções estão-lhe em continuidade: encontramos algo deste pioneirismo em João Paulo Esteves da Silva e no jovem Júlio Resende, por sinal eles também pianistas e compositores, eles também de formação clássica e eles também confessadamente influenciados por essa figura ímpar do piano que é Keith Jarrett e de quem o autor do duplo álbum agora lançado pela David Ferreira Investidas Editoriais foi o primeiro a declarar um vínculo de estilo.
O concerto que apresentou a edição no Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém teve momentos de especial emoção, fosse porque há sete anos que o músico não pisava os palcos, porque há 12 anos não era ouvido a tocar jazz, ou ainda porque entre o público que enchia por completo a sala, estavam apreciadores desta música que foram trazidos para ela há uma vintena de anos precisamente devido à sua audição – os temas líricos e vincadamente melódicos de Pinho Vargas têm essa capacidade de seduzir até os ouvidos mais receosos. Tal como o tocado no álbum, o repertório do espectáculo foi uma revisão das partituras que escreveu para o jazz. Assim, tratou-se de um fechar de contas com o passado, mas se teria sido interessante conhecer temas inéditos – apenas um foi apresentado -, o certo é que o músico de Gaia aproveitou a oportunidade para reapresentar as suas composições sob uma luz diferente, e em boa hora o fez. A sós com o piano, a abordagem é mais essencialista, ficando a nú os processos utilizados. Por exemplo a particularidade de o músico improvisar não a partir dos temas mas dentro deles.
Menos conotado nesta actuação e nestes dois discos (que serão quatro quando em 2009 sair o segundo volume de \”Solo\”) com a \”estética ECM\” e a sonoridade desta etiqueta discográfica alemã, e denotando com grande evidência a opção erudita entretanto tomada, mais se destaca agora a inspiração de António Pinho Vargas na música tradicional portuguesa, melhor reconhecemos as suas referências no minimalismo (para todos os efeitos, estudou com Louis Andriessen) e mais clarificadas estão afinidades pianísticas com Abdullah Ibrahim / Dollar Brand e John Taylor. Se este regresso ao jazz com outras coordenadas significa que vêm aí novos projectos e nova música é o que verificaremos de seguida. Para já, o importante é assinalar que todo o bom filho a casa torna.

Alberto Mourão, Jazz.pt #20